quinta-feira, 5 de março de 2009

Tentativa 3: Cinzento




Há-de ser um copo partido

e uma dor consertada

Eis um copo poisado

e uma dor deitada

Ciência do oculto

névoa deslizante

o copo percorre

e ele não me diz nada

Uma boca fechada

que fala p'ra dentro

dada a condição

diz asfixiada

...e na loucura telepática

estava assim quem a ouvia

e intimamente escutava...

na dor cedo entendia

que o silêncio era cinzento

da exacta cor do cimento

onde almas são sepultadas

voando desperdiçadas

cinzas espalhadas ao vento

poeiras universais

E eu na terra aqui sentada

pergunto se o copo fala

se tem o dom da palavra

literatura oralidade

goteja um estranho veneno

cordas vocais articulam

língua rola céu da boca

loucas os sons desembrulham

alfabeto caos explosão

Eis o copo: era um vazio

cinzento da cor do chão

e é este mundo que treme

se as palavras têm frio

se os verbos não se conjugam

desenfreadas galopam...

...ataque de coração

silêncio!

um copo caiu no chão.



Imagem Daqui


13 comentários:

Anónimo disse...

Tenho acompanhado a evolução da paleta de cores e tenho a dizer-te que gosto e que acho que escreves muito bem. Grande beijo!

Heduardo Kiesse disse...

todos os corpos, todos os copos num só licor - versatório!! num poema de mãos dadas com a beleza!
saio inspirado por ti!
gostei muito, a séio!!

Nilson Barcelli disse...

Olá Ana Paula, gostei da poesia que aqui li. Deste e doutros poemas anteriores.
Escreves bem, és poeta. Parabéns pela tua criatividade.
Beijo.

Mié disse...

Gostei muito.

Cinzento...mesmo!

um beijo

terno

Violeta disse...

Mas que poema...
Silêncio que este me tocou mesmo, como tudo o que escreves...
Obrigada!

Carla Ribeiro disse...

Belas as palavras que se encontram neste espaço.

Anónimo disse...

O coração é assim como tu dizes no prórpio poema, num momento e que muito gostei: "este mundo que treme
se as palavras têm frio". Voltei a gravar a Poética.Um beijo.

ARTISTA MALDITO disse...

Olá Ana Paula

Um poema (trans)lúcido, com a lucidez que a Ana Paula tem. De um copo pode verter a água pura, mas também pode "destilar" veneno. E achei maravilhosa a identificação de copo/corpo.
A vida tem destes momentos, complexos: o silêncio a preceder a queda.

Beijinhos e com muita amizade,
Isabel

Ana Paula Sena disse...

Muito obrigada a todos(as) pela simpatia e incentivo!

Mas... é "um comboio de corda, chamado coração, que gira, a entreter a razão", segundo as sublimes palavras de Fernando Pessoa.

Obrigada por partilharem comigo esta tentativa pessoal de fundir razão e coração nas "calhas de roda" :):)

Maria do Rosário Reiche disse...

Minha querida amiga de sempre e para sempre... tens o dom de tocar a alma das pessoas, sabias?
Começa a ser altura de partilhares com mais gente esses sentires.
Publicação obrigatória já!
Um beijo do coração.

Maria do Rosário Reiche

mdsol disse...

Saudades de vir por aqui!
É um prazer...
:)))

Anónimo disse...

Obrigado pelas tus palavras. Irás ver e ouvir mais poemas com estas reflexões sobre a palavra, a fala. Cheguei quase a deixr de escrever ppois tinha chegado à conclusão de que tinha escrito tudo e de que outros já o tinham feito melhor. MAs não se pode ser assim e comecei a publicar. Gravar vai ser complicado. Final de período, formação, coordenação de ano. Bom, Ana Paula. Descansa e bom rabalho no fim de-semana, já sei. Tenta divertir-te, também, se for possível.

Ricardo António Alves disse...

Muito interessante, Ana Paula.
Parabéns de novo!

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