segunda-feira, 10 de março de 2008

S.O.S. ... Educação...

Ali à frente há um muro. Do outro lado há um mar.
Deixa-me comunicar...
Mostra-me uma Route 66 via educação:
há que ajudar a ligar este oceano aquele outro... Oceano.







Encontrei esta mensagem. Não me canso de reflectir nela.

"A necessidade de transmitir conhecimento e competências, o desejo de os adquirir são constantes da natureza humana. Mestres e discípulos, ensino e aprendizagem deverão continuar a existir enquanto existirem sociedades. A vida tal como a conhecemos não poderia passar sem eles. Contudo, há mudanças importantes em curso.

(...) A computação, a teoria da informação e o acesso à mesma, a ubiquidade da Internet e da rede global envolvem muito mais do que uma revolução tecnológica. Implicam transformações de consciência, de hábitos de percepção e de expressão, de sensibilidade recíproca, que mal começámos a avaliar. Em inúmeros terminais e sinapses, estas novas estruturas ligar-se-ão ao nosso sistema nervoso e estruturas cerebrais (possivelmente análogos). O software tornar-se-á, por assim dizer, interiorizado, e a consciência poderá ter de desenvolver uma segunda pele.

O impacto sobre o processo de aprendizagem é já capital. Sentada em frente da sua consola, a criança tem acesso a novos mundos. Tal como o estudante com o seu laptop e o investigador que navega na Net. As condições da troca e do debate, da colaboração, do armazenamento de memória, da transmissão imediata e da representação gráfica reorganizaram já numerosos aspectos da Wissenschaft. O ecrán pode ensinar, examinar, demonstrar, interagir com uma precisão, uma clareza e uma paciência que ultrapassam a de um instrutor humano. Os seus recursos podem ser disseminados e mobilizados à vontade de cada um. Não conhece preconceitos nem fadiga. Por seu turno, o aprendiz pode questionar, objectar e responder numa dialéctica cujo valor pedagógico poderá vir a suplantar o do discurso falado.

(...) A transmissão do conhecimento e da techne dependerá cada vez mais de outros meios e modos de relacionamento. (...)

(...) As «lições dos mestres» poderão, deverão sobreviver aos ataques?
Creio que sim, ainda que seja sob formas imprevisíveis. Creio que é necessário que sobrevivam. A libido sciendi, a sede de conhecimento, a necessidade profunda de compreender estão inscritas no que de melhor têm os homens e as mulheres. Tal como a vocação de professor. Não há ofício mais privilegiado. Despertar noutro ser humano poderes e sonhos além dos seus; induzir nos outros um amor por aquilo que amamos; fazer do seu presente interior o seu futuro: eis uma tripla aventura como nenhuma outra. À medida que cresce, a família dos nossos antigos alunos é como a ramificação, a folhagem de um tronco que envelhece (...). É uma satisfação incomparável ser o servidor, o mensageiro do essencial - sabendo perfeitamente como são raros os criadores ou descobridores de primeira água. (...) ensinar, ensinar bem, é ser cúmplice de possibilidades transcendentes. Uma vez desperta, essa criança exasperante que se senta na última fila poderá escrever os versos ou conjecturar o teorema que ocuparão séculos. Uma sociedade, como a do lucro desenfreado, que não honre os seus professores, é uma sociedade defeituosa. (...)

(...) a relação entre Mestres e discípulos é falível, (...). Mas as suas esperanças eternamente renovadas, a maravilha imperfeita da coisa, apontam para a dignitas da pessoa humana, para um regresso ao que de melhor existe em nós. Nenhum meio mecânico, por mais expedito que seja, nenhum materialismo, ainda que triunfante, poderá erradicar esse alvorecer interior que experimentamos sempre que compreendemos um Mestre. Essa alegria não torna a morte mais fácil. Mas alimenta a nossa raiva contra o desperdício que ela representa. Não temos tempo para outra lição? (...) "
in As Lições dos Mestres, George Steiner


8 comentários:

Mié disse...

Muito pertinente este texto nestes tempos tão conturbados da Educação, das questões que se põem ou se deveriam colocar sobre como e para quê transmitir conhecimento e que tipo de conhecimento.


"Nenhum meio mecânico, por mais expedito que seja, nenhum materialismo, ainda que triunfante, poderá erradicar esse alvorecer interior que experimentamos sempre que compreendemos um Mestre."

Vou pra Norte e volto depois da Páscoa

Deixo-te um beijo

e desejo de boa Páscoa

Tríade Aumentada disse...

... É falível, mas não deve ser impossível.


Um abraço a triplicar!!!

Ouriço disse...

Fase complicada, esta.
bjs

Isabel Victor disse...

Oh, Ana paula, gostei de (te) ler ...

Esta atitude (esta crença) eleva-nos. Este fomentar do desejo de aprender é a chave ! Adorei ...

Deixo-te um beijo * docente (:(:

IV*

Aestranha disse...

Olá Ana paula!

Este texto é um bom exemplo do que os professores devereriam estar a ler e das perguntas essenciais a serem feitas neste momento da história ocidental... Mas a crise social que afecta os professores portugueses não estará a deixar muito tempo para estas leituras e preocupações...

Portugal corre o risco de uma analfabetização mascarada de sucesso na aprendizagem. As novas tecnologias só servem para quem as possa aprender e não o contrário... Também não nos deve escapar o facto de que a aprendizagem se dá sempre dentro da relação humana e nunca fora dela. Mesmo que eu aprenda na internet, eu só o aprendo se tiver a noção de que o que leio foi escrito por um semelhante meu, se eu não tiver esta noção estou perdida para o aprender porque estarei irredutivelmente louca.

As "lições do Mestres" continuam a ser as pedras base da aprendizagem, por isso mesmo os "Mestres" deveriam de ser acarinhados e não expulsos à pedrada...

Muito mais haveria para dizer sobre este assunto...

Muitos beijos!

Anónimo disse...

querida ana paula, só hoje tive o tempo necessário para te ler com a devida atenção e apesar de não ser professora, gosto das palavras do george steiner, um sábio que aqui em enquadra, a meu ver, muito bem. também gostei de ouvir o sting :)

um grande beijinho.

Mar Arável disse...

Na verdade

nenhum meio mecânico

pode substituir as pessoas

Aprender sempre pois claro

e-ko disse...

um belo texto do Steiner

mas nesta questão de aprender e ensinar ainda há outras questões que o texto não aborda: a educação que também é uma educação para aprender e que não depende só dos mestres...

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