sexta-feira, 9 de julho de 2010

Poemas da minha vida

Um poema especial tem que constar. Dei com ele há uns anos atrás...e logo constituiu, para mim, uma referência:

Que o medo não te tolha a tua mão
Nenhuma ocasião vale o temor
Ergue a cabeça dignamente irmão
Falo-te em nome seja de quem for

No princípio de tudo o coração
como o fogo alastrava em redor
Uma nuvem qualquer toldou então
céus de canção promessa e amor

Mas tudo é apenas o que é
levanta-te do chão, põe-te de pé
lembro-te apenas o que te esqueceu

Não temas porque tudo recomeça
Nada se perde por mais que aconteça
Uma vez que já tudo se perdeu

Ruy Belo


[o sublinhado é meu]

12 comentários:

Ricardo António Alves disse...

E não ha mais?

Ana Paula Sena disse...

Claro que sim, RAA. Há muitos mais.
Mas este é o primeiro da série.

O Haddock está com um ar feroz :) Brrrr...

Joaquim Maria Castanho disse...

Sujeição Ante o Resultado Acontecido...

Ao luar, entre as diatribes da luz
Das coisas, das sombras esmaecidas
Recordo agora, havia biliões de rosas
Vermelhas, quase todas se tida jus
Houvesse no dizer, caídas, esquecidas
Entre as estantes, sobre as mesas
Acocoradas aos cantos, acetinadas
Folhas entre as demais páginas
Espelhando os sentidos nos sentires
Embora eu, ao ver-te assim repartida
Clonada pela refracção das lágrimas
Te fizesse em absoluto reflectida,
Cuidasse serem cada qual tu apenas
Noutra forma desigual às pequenas
Surgidas dos canteiros e jardins
Dos beirais, esquinas, nuvens, sebes
Alucinação de louco entre querubins
Não destrinçando minha sede das sedes
Que todas as flores, lírios, jasmins
Orquídeas, hortênsias, cravos, alecrins
Estevas, afinal, que todas por igual têm
Achando a minha maior, mais imperiosa
Como nenhuma outra, e que mais ninguém
Tivera já, ao ver em tudo e todos só rosas
Rosas, e rosas, e rosas de pétalas acesas
Simplesmente porque tu as foste ou és
Entre as estantes, os arcos, as devesas
Sentada, caminhando, sobre cadeiras
Nas muralhas, claustros e seteiras
Arrumando o carro na berma da estrada
Descendo a rua ou subindo a escada
Entrando na sala de aula na tua escola
Vindo do café, lendo revistas ou tão-só
Navegando na Net e ouvindo meu dó
Pedido não trinado por qualquer viola
Mas antes no desmedido obstinado
De um coitado ansiando pela esmola
Da tua atenção, do teu tempo e olhar
Insistindo, porém insistido no rimado
Exagero requerido de poemas a dançar
Numa roda de dizeres repetidos sem fim
Na crença tida que ao ver-te em todo lado
Tu venhas um dia, enfim, a reparar em mim.

Todavia acordado, até no quotidiano viver
Durante as tarefas como nas conversas tidas
Ao fazer as compras nos hipermercados
Quando pelo autocarro espero, subo, desço
Escrevo recados, de manhã ou ao entardecer
Avalio as escritas passadas já imprimidas
Descoso as entretelas de filmes visados
Arrumo a casa, lavo a louça, e no avesso
De mim me viro para corar o íntimo ser,
Então, continuo a ver rosas onde rosas via
Flores atrás de flores a cada hora, cada dia
Segundo a segundo a cada e todo o instante
Feitas de jade, porcelana, diamante
Esmeraldas, quartzos, pérolas, rubis
Quer nas velas sobre o oceano navegante
Quer nas serras e descampados primaveris.

Estendidas sobre toalhas das praias e areais
Na relva das piscinas campestres e barragens
Nos rios, tombadilhos de barcos, nas carruagens
Do Metro, discotecas, esplanadas, jornais
E revistas, em fotos e quadros e textos originais
De poetas inéditos como dos clássicos antigos
Que mais não escreveram do que palimpsestos
Dos meus, envelhecendo-lhe eras e contextos
Dando-lhe atmosferas idas e velhos artigos
Ou arcaicas cantigas de amigos e madrigais.

Pois bem: a essas flores, oriundas das cascatas
Das ondas, numa vaga de espuma e incenso
Tão vivazes, ríspidas, vagabundas e insensatas
Amei-as todas, por causa de uma, em que penso!

Manuela Araújo disse...

Ana Paula

Gostei, também especialmente deste poema, que não conhecia.

Obrigada pela partilha.

Um beijo e bom fim de semana.

via disse...

boa, Ruy Belo, anda tão esquecido, nem tudo se perdeu, penso eu...bjo

Spark disse...

Mto fixe :)

Manuela Freitas disse...

Esse excelente poema de Ruy Belo, é um tratado de vida ou para a vida!...Gosto do que sublinhou:
«Não temas porque tudo recomeça
Nada se perde por mais que aconteça
Uma vez que já tudo se perdeu»

Gosto de Ruy Belo e a semana passada andei a ler pela net uns poemas, só tenho um livro dele, «País Possível».
Beijinhos,
Manuela

Há.dias.assim disse...

Há muito tempo que não lia nada de Ruy beli.
Obrigada, tb pelo sublinhado...
Boa semana

Há.dias.assim disse...

Há muito tempo que não lia nada de Ruy belo.
Obrigada, tb pelo sublinhado...
Boa semana

mdsol disse...

Também gosto muito do Ruy Belo. Que bom "tropeçar" nele aqui.

:)))

Carlos Pires disse...

Mas que sei eu

Mas que sei eu das folhas no outono
ao vento vorazmente arremessadas
quando eu passo pelas madrugadas
tal como passaria qualquer dono?
Eu sei que é vão o vento e lento o sono
e acabam coisas mal principiadas
no ínvio precipício das geadas
que pressinto no meu fundo abandono
Nenhum súbito lamenta
a dor de assim passar que me atormenta
e me ergue no ar como outra folha
qualquer. Mas eu sei que sei destas manhãs?
As coisas vêm vão e são tão vãs
como este olhar que ignoro que me olha

Ruy Belo

Carlos Ramos disse...

O Ruy Belo é um dos maiores escritores de sempre da nossa lingua. De vez em quando volto aos seus "Todos os Poemas" que foram poucos para um tempo tão breve.
Parabens por este blog. Espaço do sensivel.

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Muitas vezes, diz-se: nunca regresses a um lugar onde já foste feliz. Mas como não procurar todos os lugares que nos parecem compatíveis com...