"(...) nem as circunstâncias da justiça nem os seus canais são os do amor. E menos ainda são os do amor os argumentos da justiça. Para dizer a verdade, o amor não argumenta (...)." - Paul Ricouer, Amor e Justiça
Eric White, Portal (2010)
Dizem que o inverno é reflexivo e que convida a pensar, talvez mais devagar. E eu tendo a concordar - quando saio à rua e o ar frio parece queimar o meu rosto, ou quando a chuva fustiga a minha efémera existência para lá do casaco que sabe a protecção... A lentificação provocada pelo frio é uma espécie de lugar onírico que potencia as sensações. Por força dessa maximização, há também uma difusa percepção de tudo: há Natal, é verdade, há festa, compras e multidões, há afectos e desafectos, encontros e desencontros, e tanto mais, no movimento apressado da preparação dos rituais. O movimento interior, no entanto, é lento. Em tempos, também os rituais o eram. Imersos agora nesta duração e nos lugares da época, levados na corrente, todos parecem apressar-se em busca de alguma coisa urgente... Talvez de certo mágico lugar onde possa enclausurar-se o afecto que combate a finitude, fugindo à dispersão.
Aos afectos é costume chamar-se amor, qualquer que seja o seu carácter particular. Mas, na procura de tudo, há também uma espécie de corrida para chegar a um certo limiar no qual sempre se afronta o desconhecido. Transpor o portal, uma vez aí, é o derradeiro acto que nos consome no desejo de arder como eterna chama. Essa porta que é preciso abrir para o que nos faz felizes, encerra mistérios e segredos, parece-nos, assim o sentimos. Mas, ao abri-la, é bem possível que nos espere tão somente uma grande exigência: a de viver por inteiro. E isso é o mais difícil. De cada parte, pode ser fácil dar conta. Mas do todo...! Aí, acontece ser bastante mais complicado. Tudo isto para dizer, é claro, imbuída desta atmosfera invernosa, reflexiva e natalícia, que o amor não é fácil. Nem sequer o amor universal, apesar do seu carácter abstracto. Estará o amor, enquanto imperativo maior, acima da própria justiça? Em que ponto poderão encontrar-se? Ou incompatibilizar-se? A verdade é que se o amor não é fácil, a justiça parece sê-lo menos ainda. Viver esta dialéctica e trazê-la para o lugar concreto de cada vida é um dos maiores desafios.
Transpor um limiar para descobrir algo importante, é quase como dar um salto para um precipício. Lá em baixo, o desconhecido... Pensamos antes de dar o salto, ou saltamos, e depois logo se vê...? Argumenta-se pela justiça, ou segue-se o imperativo do amor? Também podemos considerar que uma coisa não tem nada a ver com a outra. Mas, será mesmo assim? Por outro lado, amar de forma justa, ou ser justo por amor, parece uma verdadeira utopia. No entanto, sinto que ela está comigo neste Natal...
Aos afectos é costume chamar-se amor, qualquer que seja o seu carácter particular. Mas, na procura de tudo, há também uma espécie de corrida para chegar a um certo limiar no qual sempre se afronta o desconhecido. Transpor o portal, uma vez aí, é o derradeiro acto que nos consome no desejo de arder como eterna chama. Essa porta que é preciso abrir para o que nos faz felizes, encerra mistérios e segredos, parece-nos, assim o sentimos. Mas, ao abri-la, é bem possível que nos espere tão somente uma grande exigência: a de viver por inteiro. E isso é o mais difícil. De cada parte, pode ser fácil dar conta. Mas do todo...! Aí, acontece ser bastante mais complicado. Tudo isto para dizer, é claro, imbuída desta atmosfera invernosa, reflexiva e natalícia, que o amor não é fácil. Nem sequer o amor universal, apesar do seu carácter abstracto. Estará o amor, enquanto imperativo maior, acima da própria justiça? Em que ponto poderão encontrar-se? Ou incompatibilizar-se? A verdade é que se o amor não é fácil, a justiça parece sê-lo menos ainda. Viver esta dialéctica e trazê-la para o lugar concreto de cada vida é um dos maiores desafios.
Transpor um limiar para descobrir algo importante, é quase como dar um salto para um precipício. Lá em baixo, o desconhecido... Pensamos antes de dar o salto, ou saltamos, e depois logo se vê...? Argumenta-se pela justiça, ou segue-se o imperativo do amor? Também podemos considerar que uma coisa não tem nada a ver com a outra. Mas, será mesmo assim? Por outro lado, amar de forma justa, ou ser justo por amor, parece uma verdadeira utopia. No entanto, sinto que ela está comigo neste Natal...
Um grande abraço a todos os amigos/as do Catharsis.
Obrigada pela vossa preciosa companhia.
Feliz Natal!
15 comentários:
Ainda bem, Ana Paula!
Feliz Natal <:)}
Quem procura pensar, os males tenta espantar :) - tenta-se!
Obrigada, Ricardo! Um muito Feliz Natal para si também!
Belo texto,
notável reflexão!
Lembra-me Platão
n'"0 Político",
quando coloca
o líder como
decisor final,
mesmo para lá
do que a lei
estipule e obrigue.
Assim, o amor
face à justiça.
Bom Natal,
Ana Paula,
e a toda
a família.
V.
A justiça, sendo importante, não passa de um substituto do amor, uma compensação social e política para a impossibilidade total do amor.
Feliz Natal também para si.
JR
Feliz Natal, Ana Paula.:)
Olá, Vasco :)
Obrigada pelas tuas palavras.
...os limites da justiça, ou os limites do amor... existirá um sem-limite, na nossa condição?
É bom partilhar contigo estas coisas!
Feliz Natal, para ti e toda a família.
José Ricardo Costa:
...uma interessante perspectiva que me sugere outros momentos de reflexão e escrita, no futuro. Retenho "a impossibilidade total do amor" - parece-me importante e frutífero...
Um Feliz Natal!
Querida GJ, que bom vê-la por aqui :)
Muitas felicidades para si neste Natal!
O amor como utopia, sim, nunca uma realidade conseguida. O amor é estranho, um mistério. Talvez relendo Camões possamos tentar perceber o que ele é: "Amor é fogo que arde...". Excelente soneto, reflexão sentida e muito pertinente sobre o amor, que, aqui, mais se confunde com paixão, talvez o estado inicial do amor, e que nós gostaríamos, sei lá, de saber prolongar. Poderíamos deambular pelas categorias do amor, mas o importante é reter o dar e receber, partilhar, ceder e avançar, permanecer e transcender. Isto é certo: as festas, estas festas, são sempre um motivo para um aconchego mais profundo, para um religar mais profundo, estando mais connosco e com o outro. Saúde e Alegria, Ana Paula! Abraço.
Agradeço a sua companhia e aproveito para desejar um Natal muito Feliz beijinhos.
Ana Paula,
belo texto...
Dia(s) de amor...
Bom Natal... beijonhos
Ana
Apesar de o Natal ser para mim uma época que eu dispensaria sem qualquer problema é bom perceber que ele é um bom "pretexto" para se escrever e ler textos como este. Um abraço também, Ana Paula. E nós é que agradecemos, claro.
Feliz Natal e Boas Festas!
Abraço!
Um texto a merecer reflexão.
Venho desejar-lhe o melhor 2011
possível.
Bj.
Será possível articular essas duas realidades?
Amor tem forçosamente, que ser compativel com justiça? A que "tipo" de amor nos referimos? O amor é o sentimento mais lato, mais abrangente, mais transversal à vida do Homem. E a justiça. Que tipo de justiça?
Ana Paula, esta "conversa" levar-nos-ia longe, e que interessante poderia ser.
Bom 2011, como tudo de bom.
Que o Catharsis continue sempre por aqui, a fazer-nos pensar...
Beijinho.
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