"Io sono l'amore" (2009), de Luca Guadagnino, é um filme pautado pelo regresso a grandes cineastas italianos, com uma estética muito clássica, mas desprendendo-se da magnífica herança de Visconti ou de Fellini, através de um olhar renovado e experimental. De todas as imagens gravadas na minha memória, destaco aquelas das cenas passadas na sala de jantar, à mesa, durante as refeições: estranhas, fantásticas, inesperadas.
Gostei imenso do filme, embora possa apontar-lhe alguns defeitos (o final pareceu-me excessivamente precipitado, por ex.). A primeira sensação é a de que estamos perante um cinema realmente diferente daquele que nos bombardeia diariamente. Só por isso já vale a pena - o que nos aparece no ecrã consegue alargar os horizontes do nosso próprio olhar. Depois, há uma história que podia ser banal, transformada num melodrama de dimensão operática. Para isso muito contribui a música de John Adams. O desenlace final, quer no seu ponto mais alto, quer no pós-clímax, alimenta-se desta sonoridade angustiante, mais tarde sussurrante. Mas tudo começa muito antes - com o prazer de comer, com o requinte da apresentação dos pratos, com os estranhos e improváveis condimentos, com as receitas italianas e russas... Tudo temperado com muitas ambiguidades.
Na improbabilidade da história reside grande parte da sua riqueza emocional. É pela energia vital, esse movimento do ser que introduz rupturas e descontinuidades, que o amor nos é apresentado. Afinal, é o que pode ser um olhar sobre a vida - subjaz ao filme um toque de Nietzsche que nos faz pensar... Lá do alto das montanhas, Emma constata que as perspectivas são outras.
Se o amor pode ser considerado um tema menor (?), o que o filme faz é dar-lhe grandiosidade. Afinal, a história podia ser um dos enredos mais vulgares de telenovela. Mas, eis que é drama intenso e apoteose do ser.
São várias as vezes em que o filme resvala para esse paradigma actual (ainda que não só de hoje) da fusão com a natureza - o corpo mal se distingue, pulsante e incorporado na vegetação, devorado já pelas grutas e suas sombras... Mas é preciso referir também as belas imagens de Itália. E, por último, mas não menos importante para o olhar, os vestidos magníficos de Tilda Swinton, numa excelente interpretação.
O filme consegue ser sublime.
Imagens: pesquisa do Google
8 comentários:
Um belíssimo filme, sem dúvida. Emma Recchi (e sim, Tilda Swinton é fabulosa) conseguiu provar que existia, mesmo quando lhe diziam o contrário. E, quanto a mim, o final só é precipitado porque segue o ritmo dos próprios acontecimentos.
Olá Ana Paula
Depois de ler o seu texto, fiquei com vontade de ver o filme. Já vi que não está em Braga, e no Porto só numa sala. Este fim de semana não posso, espero que ainda esteja em cena no próximo.
E as imagens de Itália... adorei o filme "Beleza Roubada" de Bertolucci, por várias razões, mas sem dúvida que bastavam as imagens da Toscânia.
Beijinhos e obrigada pela crítica.
Será que ainda o consigo ver?
Sublime, Ana Paula, sem dúvida. Achei-o "italiano" do príncipio ao fim: na elegância dos personagens, nos decors, na realização carregada de pormenores, na cuidada utilização da música... Sabe, amanhã vou ver de novo :):)
Não vi :(
Deve ser belo.
Virá para os arredores
da Linha...? :)
Gostaria de vê-lo.
Obrigada a todos pela vossa atenção :)
Analima: vi no seu blogue que também gostou muito do filme. Em relação ao final, talvez eu gostasse que ele fosse um bocadinho mais explorado, comparado com todo o tempo dedicado ao antes. Mas foi certamente uma opção do realizador, a qual é de respeitar, e mesmo apreciar...
Um abraço :)
Manuela: aqui por Lisboa também só está numa sala, por enquanto. Espero que possa vê-lo, creio que vai gostar.
Não escrevo sobre todos os filmes que vejo e de que gosto, mas em relação a alguns, dá-me prazer fazê-lo.
Ahh, a Toscânia belíssima! Digo eu, que nunca lá fui :(
Beijinhos :)
Há.dias.assim: espero que possa vê-lo. Estou certa de que vai gostar.
Beijinhos :)
Paulo: muito "italiano", é verdade. Sabe, eu também o via segunda vez... por isso, compreendo que o faça. Mas, entretanto, fui ver "El Secreto de Sus Ojos", outro objecto de deleite cinéfilo.
Um abraço :)
Vasco: é belo, sim.
Julgo virá até às bandas da Linha, mais tarde. Mas vi-o em Lisboa.
Um abraço :)
Ana Paula você sempre nos oferece dicas maravilhosas.por isso é sempre um grande prazer fazer um tour pelo seu blog. Vou procurar este filme aqui no Brasil.
bjs, Eliete
Olá querida Ana Paula,
Fui hoje ver o filme, com tanto calor, ficar na frescura da sala de cinema, ainda é o mais agradável.
O filme é deslumbrante, clássico e cheio de beleza...todos aqueles actos cerimoniais, dizem muito a nível de olhares trocados! Preciso de pensar!...
Foi estranho o fim, a saída de Emma, com a música em crescente, seguida da ficha técnica, para depois aparecer uma imagem intrigante, que parece uma gruta, com pessoas indefiníveis! Acontece que muitas pessoas sairam antes desta cena!
Beijinhos,
Manuela
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