segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

O amor a duas vozes

«Bem desejaria poder dizer a si mesma que estava enganada quanto aos seus escrúpulos relativamente ao passado e aos seus receios relativamente ao futuro. A razão e o seu dever mostravam-lhe, noutros momentos, coisas totalmente opostas, que a levavam rapidamente à resolução de não voltar a casar e de nunca mais ver o Senhor de Nemours. Mas era uma resolução bem violenta de estabelecer num coração tão enternecido como o seu e ainda de novo abandonado aos encantos do amor. Enfim, para recuperar alguma calma, pensou que não era ainda necessário violentar-se tomando resoluções; as conveniências davam-lhe um tempo considerável para se decidir. Mas resolveu continuar firme quanto a manter qualquer relação com o Senhor de Nemours. O Vidama foi visitá-la e defendeu a causa do príncipe com todo o espírito e aplicação imagináveis, mas não pôde fazê-la mudar de conduta, nem em relação à que havia imposto ao Senhor de Nemours. Disse-lhe que a sua intenção era permanecer na situação em que se encontrava; que sabia que esse desígnio era difícil de executar, mas que esperava ter força para tanto. (...)»
in A Princesa de Clèves, Madame de Lafayette





«Acabo de ter esta noite a prova de que a música, quando perfeita, põe o coração exactamente no mesmo estado em que se encontra quando goza a presença de quem ama; isto é, dá aparentemente a mais intensa felicidade que existe neste mundo.
Se assim acontecesse com todos os homens, nada no mundo predisporia mais para o amor. (...)
O hábito da música e dos sonhos que ela provoca predispõe para o amor. (...)»
in Do Amor, Stendhal










Imagens: pesquisa do Google

15 comentários:

José Ricardo Costa disse...

Entendo perfeitamente o que diz Stendhal. Mas há que ter alguma cautela com o entusiasmo. O Estado-Maior nazi estava cheio de melómanos.

JR

via disse...

prefiro amar alguém à música- no amor a uma pessoa o outro responde, é livre, a música não, responde mas não é livre, nós sim. complicado de expressar. e não é esta a única razão pela qual prefiro pessoas. bjo boas férias, enjoy it!

observatory disse...

eu queria tanto poder falar-lhe disto...

:(


perdi a memoria

Mar Arável disse...

Belo casamento de palavras

A duas vozes e quatro mãos

Bjs

Miguel Gomes Coelho disse...

Então, o melhor é ouvir música, música, música...
e aguardar calmamente que a "princesa" se decida...
Um abraço, Ana Paula.

José Manuel Marinho disse...

Edição particularmente feliz. Curiosa a apreciação sobre a música de Stendhal. De facto, "O hábito da música e dos sonhos que ela provoca predispõe para o amor.", pois induz a estados de exaltação criando predisposização para o encontro, uma condição essencial para o amor. Claro que a "música" precisa de ser "perfeita", isto é, dialogar com o corpo e a mente, originando uma harmonia completa no ser. Tudo de bom.

Violeta disse...

Já tinha saudades de vir aqui.
Vou mesmo enternecida.
Um feliz dia de Carnaval. Eu vou ficar a escrever sobre áreas Marinhas Protegidas...

Aprendiz disse...

A música tem poderes inimagináveis. É capaz de nos influenciar o estado de espírito e revelar o nosso Ser à semelhança de outras artes. É capaz de ser usada enquanto espelho da alma e de sentimentos dificilmente expressos pela linguagem, mas também enquanto veículo de revoluções.

partilha de silêncios disse...

Gostei dos textos seleccionados, achei interessante a análise,mas o amor é sempre difícil de explicar...

um beijo

Ricardo António Alves disse...

Pois predispõe.

C. disse...

Cara Ana Paula,
que bom tem sido ler estes posts.
Falou de música e eu sou suspeita, porque me seriam difíceis os dias sem ela. O mundo já, assim, é tão "vazio" e indecifrável. Imagine-se um mundo sem música. Penso que há trechos que podem ajudar à nossa disposição para o amor, mas se não nos dipusermos a amar...
(Claro que,como outras formas de arte - veja-se a poesia, a literatura - serviu senhores e servos. Foi feita por ambos.)
Às vezes parece, com algumas melodias, que os músicos estavam cheios de inveja dos pássaros.
:-)

Um abraço

mdsol disse...

É sempre um prazer vir aqui! Muito grande. E viva o amor.

Beijinho

:))

manuel afonso disse...

Sabia que a música já era utilizada para fins terapeuticos, para acalmar temperamentos, mas que podia substituir o amor, isso não sabia, confesso. Bom, pela minha parte adoro música, cada vez mais calma, nostálgica, clássica, mas que não substitua o amor. O ideal é que seja amor ao som de uns bons acordes.

A disse...

Olá, Ana Paula.
Embora eu tenda para Stendhal( subscrevo o comentário de JR Costa), o dialógo estabelecido (por si)entre os dois excertos é interessantíssimo.

Felicito-a pelo post!
Abraço.

Manuela Freitas disse...

Olá Ana Paula,
Gostei bastante dos dois textos, só conhecia o de Stendhal sobre a música. Não considero que a música possa ser similar ao amor, mas que dá uma grande tranquilidade e emotividade à alma, isso dá!
Lembrei-me de um amigo, pianista, consequentemente grande mélomano e ele dizia que a música com a sua linguagem universal unia as pessoas e então em chalaça, dizia que o problema entre Israel e a Palestina (num período mais crítico) se resolvia com a formação de uma grande orquestra, composta de instrumentistas mistos! Era uma ideia delirante, eventualmente podia acontecer como no filme de Fellini «A orquestra»!...
Desculpe Ana Paula a divagação!...
Deve ter muito que fazer e muito em que pensar, mas sinto os dias vazios do seu blogue!..
Beijinhos e boa semana,
Manuela

Regresso ao futuro

Muitas vezes, diz-se: nunca regresses a um lugar onde já foste feliz. Mas como não procurar todos os lugares que nos parecem compatíveis com...